Autismo vicia, cuidado!

Foto criada em 03-03-13 às 12.18 #3

Há um tempo atrás participei de um workshop sobre autismo realizado pela ONG Autismo & Realidade onde havia um ciclo de palestras para pais e terapeutas e também outras palestras para os médicos. Também havia um atendimento/intervenção feito por profissionais americanos, convidados especialmente para o evento.
Julia foi convidada a participar dessa oportunidade, pela idade que tinha, por ser menina e também por ser uma autista não-verbal. Tudo era feito numa sala improvisada como um estúdio e transmitido “ao vivo” para o auditório ao lado, onde todo o público ficaria observando o que era feito e comentado.
Foi aí que conheci dois grandes profissionais: Michael Alessandri e Marlene Sotelo.
Como havia previsto aprendemos muitas coisas com eles, muitas dicas de como estimular as habilidades de Julia foram passadas ali entre muitas informações importantes. Mas o mais relevante foi ter a percepção que estava muito errado na minha conduta como pai em relação ao autismo da minha filha. Me senti culpado ali. Me senti acomodado com a situação.
A partir dali comecei a me questionar o quanto estava, com isso, prejudicando o desenvolvimento dela. Eu estava resignado. Tinha aceitado o autismo e, mesmo amando do jeito que eu a amo, estava sendo conivente com a questão. Tinha me tornado um adicto do autismo dela, cerceando sua possibilidade de desenvolvimento, aceitando as fronteiras que a circunstância dela lhe impunha e, de certa forma, boicotando sua evolução.
Isso já faz um tempo. E até hoje ainda travo uma batalha interna contra essa atitude. Percebi, na época, que não adiantava apenas aceitar o destino de ter uma filha dentro do espectro autista e ali, naquele momento, uma nova consciência se instalou em minha mente com relação à isso.
(Contei todo esse fato como ilustração do que vem a seguir…)
Desde então fico atento às minhas próprias convicções. Não aceito os limites que minha filha tem e procuro sempre estimulá-la em todas as suas atividades e propostas.
Autismo atinge os pais e mães dessa forma: ficam viciados nele. Além de obcecados, muitas vezes tornam-se cegos e surdos ante ao problema. Alguns pais ainda aceitam que seus filhos façam uso de medicação muito forte para conter os seus ímpetos e diminuir o seu próprio estresse. O que não é o caso da Julia. Neste ponto, eu e a mãe dela sempre buscamos alternativas para não dar esses remédios, até porque já tínhamos conhecimento do mal que essas drogas fazem em certos órgãos com o passar do tempo. Mas cada caso é um caso. Para ela funcionou a aplicação do Protocolo Dan! E a dieta SGSC (sem glúten e sem caseína).
Mesmo assim lembro até hoje do meu sentimento de culpa e isso me faz sempre pensar em melhorar como pai, a cada dia que passa.
O autismo não pode ser aceito passivamente. Não pode ser incutido e abraçado pela família. Ele é uma condição médica. E sua permanência depende muito mais dos pais do que da criança que possui essa síndrome.
Todos os pais de autistas precisam ser os heróis dos seus filhos. Ter em mente a sua responsabilidade e procurar entender o que é preciso para fazê-los desabrochar para o mundo, sem pensar que não é possível.
Caso contrário, o autismo tornou-se uma droga potente em toda família, manipulando e tomando conta da vida de todos os seus membros.
Segue uma frase antológica de Joseph Campbell sobre a “saga do herói” de seu famoso livro “O poder do mito” e que servirá de incentivo e de meta para todos os pais que se dispuserem a mudar seu modo de enxergar o autismo:
“… Não precisamos correr sozinhos o risco da aventura, pois os heróis de todos os tempos a enfrentaram antes de nós. O labirinto é conhecido em toda a sua extensão. Temos apenas de seguir a trilha do herói, e lá, onde temíamos encontrar algo abominável, encontramos um deus. E lá, onde esperávamos matar alguém, mataremos a nós mesmos. Onde imaginávamos viajar para longe, iremos ter ao centro da nossa própria existência. E lá, onde pensávamos estar sós, estaremos na companhia do mundo todo. “

9 Comentários

  1. Rachel Paula

    Continue relatando suaas experiências. Eu também acho que não podemos nos acomodar com um diagnóstico. Nossos filhos precisam que rompamos paradigmas. Obrigada!

    • textwebwriter

      Sim Rachel é isso aí, seja bem vinda ao blog!

  2. Gostei muito das suas colocações! Realmente há um período que ficamos anestesiados. Boa sorte

    • textwebwriter

      Obg. Estela, seja bem vinda ao blog!

  3. Isabel Cristina Scalisse

    Gostaria de saber como tudo isto funciona na prática, exemplos claros de como agir
    para sairmos do vício.

    • textwebwriter

      Isabel, eu não sou especialista nem nada. Mas a partir daquele dia do workshop procurei rever meus conceitos sobre os limites da minha filha. Procurei também cuidar mais de mim, porque nos esquecemos muito por conta do autismo de nossos filhos. Nos doamos à beça e esse esquecimento causa, ao longo do tempo, várias falhas, no meu modo de entender, inclusive essa “estagnação” de limites, essa aceitação do autismo em si. Acho que a pessoa (os pais no caso) precisam estar bem para poder ajudar seus filhos. Não é egoísmo também se tratar, fazer uma terapia, buscar nossos complexos, nossos paradigmas dentro de nós mesmos. Estando bem a chance de podermos ajudar nossos filhos é bem maior. Obg pela visita e seja bem vinda ao blog!

      • textwebwriter

        Para concluir meu comentário Isabel, acredito que nós pais de autistas temos de ter a necessidade de 3 bases fundamentais: a base emocional (e isso inclui nós mesmos), a financeira e a educacional. Espero que tenha ajudado!

  4. marcos

    Fantástico o seu texto “Autismo Vicia,cuidado”.
    A postura de “combater” o autismo ao invés de aceita-lo como uma característica da criança (tipo cor dos olhos) é a verdadeira missão dos pais.
    Contudo temos de dosar este impeto de mudar o comportamento dos nosso filhos para não ficarmos escravos do padrão neurotipico e com isso eliminar a a mais divertida das características das crianças: a expontaneidade.
    valeu Martim

    • textwebwriter

      É isso aí Marcão! Bjo no Capitão América, seu anjo azul!

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